Nos dias 16 a 22 de agosto, a Igreja no Brasil celebrou a 1ª Semana Nacional da Vida Religiosa Consagrada. Promovida pela Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), a iniciativa trouxe o mesmo tema do Mês Vocacional 2020 “Amados e chamados por Deus”. A missa de abertura aconteceu no dia 16, na Catedral Metropolitana de Brasília, com a participação restrita de religiosos, devido à pandemia. A celebração foi transmitida ao vivo pelas redes sociais da CRB.
Além dessa missa, houve ainda uma programação intensa nas redes on-line, com formações sobre a vida religiosa. Destaque para a live com o tema “A relevância da vida consagrada nos tempos atuais”, que aconteceu no dia 17 e teve a participação do cardeal, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, Dom João Braz de Aviz; do bispo referencial para a vocação cristã, Dom João Inácio Muller, e da presidente da CRB, irmã Maria Inês Ribeiro.
Irmão Davi Nardi, da Congregação dos Irmãos Maristas e vice-coordenador da CRB – núcleo Aparecida de Goiânia – comentou que a proposta da semana é retomar o tema da vida religiosa consagrada, que é sempre atual. “É sempre importante retomar esse tema. Afinal, não se trata de uma profissão, mas de uma vocação e nós, como consagrados, temos essa grande missão no mundo de ser sinal, luz na vida das pessoas. Então, celebrar a vida consagrada é retomar o compromisso com o próprio Evangelho, com o próprio Cristo”, explicou. O religioso disse que a CRB Aparecida de Goiânia, assim como a maioria das regionais, seguiu a programação nacional, mas realizou no dia 20 um encontro virtual com coordenadores de núcleos e de grupos. Ele explicou também o porquê do tema “Amados e chamados por Deus”. “Nós somos criaturas de Deus feitos à sua imagem e semelhança.
Portanto, somos amados, nascemos do coração de Deus e somos chamados, pois ele quer que, cada dia, nós, homens e mulheres, caminhemos em sua direção porque o Senhor nos escolheu antes do nosso nascimento e nos amou primeiro. Esse é o chamado do coração de Deus.”
Presença no meio do povo
Questionado sobre a situação da dimensão religiosa consagrada na Grande Goiânia, irmão Davi disse que é desafiante. “A perseverança não é fácil. Muitos são convidados e a gente segue a cada dia dando a resposta e o mundo vai nos proporcionando muitas situações e alguns acabam se perdendo. Eu falo isso do ponto de vista de todas as vocações: religiosa, sacerdotal, familiar e do próprio chamado à vida. Hoje, quantas pessoas estão se suicidando uma vez que perdem o sentido da vida? Quando o ser humano pensa em suicídio é porque ele está na sua profundez absoluta de onde não consegue se reerguer”, comentou.
Sobre a atuação dos religiosos, de modo especial na Grande Goiânia, ele disse que a maior beleza dessa vocação é o estar no meio do povo. “Talvez copiando aquele cantor mineiro, Milton Nascimento, que diz que o cantor deve estar onde está o povo, a vida religiosa também tem esse compromisso de ir onde o povo está: na periferia, onde estão os abandonados, nas prisões. E nós temos aqui essa presença bonita na unidade prisional de Aparecida de Goiânia; temos presença nas políticas públicas, que é um espaço árduo de discussão; temos muitas comunidades religiosas espalhadas pelas periferias da Grande Goiânia e, mais do que isso, nós temos uma outra característica que é a oração. Todas as comunidades são como Marta e Maria, que estão aos pés de Nosso Senhor conversando, ouvindo, rezando.”
Mensagem aos religiosos e religiosas – CRB Aparecida de Goiânia (Ir. Davi Nardi)
Ao fim da entrevista, irmão Davi deixou uma mensagem a todos os religiosos e religiosas, destacando que a missão de cada um é amar com o coração de Deus.
“A grande mensagem para os religiosos presentes nesta porção da Igreja de Goiânia e de Goiás é que nós somos amados, somos escolhidos de Deus. Nós temos uma grande missão, não vamos abandonar. Vamos estar junto com o povo, caminhar junto com a Igreja, com nossos pastores e, sobretudo, estar comprometidos com a vida. Ter a certeza, como Dom Pedro Casaldáliga, um grande missionário que há pouco partiu, de estar junto com o povo de Deus em qualquer situação e em qualquer tempo, sobretudo onde a vida clama mais.
A vida religiosa é uma opção que a gente faz. É diferente da vida sacerdotal. Às vezes, nós temos na Igreja muitos sacerdotes que são religiosos, mas aparentam mais o ser padre; enquanto as irmãs, as consagradas e, particularmente, eu e os irmãos maristas e outros aqui na região de Goiânia, fizemos a opção pela vida consagrada, do seguimento radical de Jesus Cristo. Neste momento de pandemia, os religiosos mais do que ficarem trancados e isolados em casa, estão conectados com o mundo pela oração, pela assistência social, em busca de recursos, cestas básicas, políticas públicas, mesmo fechados do ponto de vista social, como toda a sociedade. A gente tem se solidarizado com essa situação de dor que o Brasil e o mundo vivem.”
A seguir, trazemos depoimentos de alguns religiosos presentes em nossa Igreja particular de Goiânia. Embora sejam poucos nestas páginas, eles expressam o ser sal e luz no mundo mencionado pelo irmão Davi Nardi e fazem ressoar aquilo que disse o papa Francisco em sua Mensagem a esta 1ª Semana Nacional da Vida Religiosa Consagrada. “Jesus é verdadeiramente o primeiro e o único amor como nos propusemos quando professamos os nossos votos? Só em caso afirmativo, poderemos, como é nosso dever, amar verdadeira e misericordiosamente cada pessoa que encontramos no nosso caminho, porque teremos aprendido dele o que é o amor e como amar: saberemos amar, porque teremos o seu próprio coração.”

“Já são mais de 20 anos de caminhada vocacional. Nesse caminho, encontrei muitas dificuldades, mas sempre recordei do meu ideal e isso me ajudou a não desistir. Os padres, que na infância eu conheci, eram muito ligados à caridade, a ajudar os pobres. Então, imaginava que conseguiria viver como eles. Porém, os tempos são outros, as dificuldades são outras,
e as exigências da vocação religiosa são bem diferentes. A catequese foi uma das belezas que encontrei na vida religiosa. Uma forma concreta de ajudar as famílias na formação das crianças e dos jovens. No meu caminho lembro sempre o lema episcopal de Paulo Evaristo Arns: “De esperança em esperança!” E, assim, consigo mais facilmente superar as dificuldades e os desafios que surgem na vida, sem perder a esperança e a confiança em Jesus Crucificado. Agradeço a Deus a oportunidade de ser um sinal do Reino, construído com o testemunho de tantos consagrados! Viva a vida religiosa!”
Pe. Rodrigo Antônio Alves, 35 anos
Congregação Passionista, 11 anos de vida religiosa consagrada. Vigário na Paróquia Nossa Senhora Aparecida, Balneário Meia Ponte, e assessor da Pastoral Bíblico-Catequética do Regional Centro-Oeste da CNBB.
“Sou feliz porque Jesus está comigo. Ingressei na Congregação para servir. E não fugi. À medida que fui vivendo a minha vocação como religiosa, compreendia, e hoje muito mais, que minha vida é de Nosso Senhor e fui crescendo nesse amor. Outro dia olhei para o retrato de Nosso Fundador, Dom Barreto, e disse: acho que não fi z tudo que devia fazer. Sempre me senti feliz! Desde a casa de minha família, vivo essa alegria que me acompanha toda a vida. Revendo a minha história, vejo que meu primeiro chamado à vida religiosa aconteceu na Primeira Comunhão. Eu havia lido sobre a vida de Santa Teresinha e ela se considerou uma gotinha no mar. Aquilo me calou. Na minha Primeira Comunhão fi z esse compromisso de ser uma gotinha no mar.”
Mensagem às jovens: Que rezem a Maria, conversem com ela, pedindo-lhe que indique o caminho a seguir. Coloquem a vocação nas mãos de Nossa Senhora!
Irmã Alva Machado
100 anos de vida celebrados no dia 15 de agosto Congregação das Missionárias de Jesus Crucificado, 82 anos de Vida Religiosa Consagrada.

“Ininterruptamente indagado pela citação “Vocação acertada, vida feliz!”, aos poucos fui me entregando ao chamado e, quando me dei conta, já estava dando respostas a esse chamado aqui na Congregação Redentorista. Recentemente, o papa Francisco disse que “Onde há consagrados, aí está a alegria”. O papa nos recorda que não somos nós que vivemos essa alegria, mas abrimos espaço para que Jesus habite em nós, que é o gerador dessa alegria. Devemos sempre estar disponíveis e desapegados, a começar pelo desapego de si mesmo e tudo aquilo que acaba nos prendendo, é um constante deixar. Enfim, na família religiosa vivemos diariamente o chamado de caminhar com Jesus, de viver seus ensinamentos, de participar de sua missão de anunciar o Evangelho como comunidade religiosa. Como vivemos esse chamado? Rezando juntos, partilhando a vida, assumindo a missão que Jesus Cristo nos confia.”
Ir. Diego Vinício Gomes, 28 anos
Congregação do Santíssimo Redentor, quatro anos de vida religiosa consagrada. Coordenador da Pastoral Carcerária da Arquidiocese e colaborador na Paróquia Nossa Senhora da Guia, Parque Buriti, Goiânia.

“Quando recebi o chamado, senti-me como o profeta Jeremias, que deu desculpas ao chamado de Deus porque não sabia falar ao povo, mas, mesmo assim, não escapou e foi seduzido por ele. Nos dias de incertezas, minha mãe Sebastiana me revelou que há 15 anos rezava pelas vocações na família, desejava ter uma sobrinha ou uma neta como religiosa, porém não esperava ser uma filha sua. Aquela revelação foi fortalecendo o meu sim, e, pela oração e simplicidade dos meus pais no cotidiano familiar, crescia em mim o desejo de ser uma Irmã de São Luís. Conhecendo mais o carisma e a espiritualidade das Irmãs de São Luís, senti-me atraída pelo chamado “Que todos sejam um” (Jo 17,21) a me comprometer a viver o amor de Deus para “Um Mundo Sanado, Unificado e Transformado”, lema da congregação. Foi um encantamento, um sim por amor, que começou com aquele encontro e nunca mais teve fim. Ingressei na congregação em 1985, e minha formação religiosa aconteceu nas periferias das cidades, onde eu sentia ser uma irmã do povo.”
Irmã Elenice Lima, 62 anos de vida
Congregação das Irmãs de São Luís. 35 anos de vida religiosa. Coordenadora da Pastoral da Aids no Regional Centro-Oeste da CNBB.

“Deus chamou-me à vida, amou-me por primeiro e despertou em meu coração o ardente desejo de seguir os passos de Jesus como religioso franciscano capuchinho. Nestes anos de caminhada, a vida fraterna tem me dado a oportunidade de amadurecer na fé, na vida de oração e de confiança na providência de Deus, como também na missão de estar junto ao povo de Deus. É um espaço de grande aprendizado, pois as várias experiências/vivências neste caminho de missão, amparado pela Palavra de Deus, sempre nos fortalecem e nos encorajam. Acredito que um dos pilares fundamentais da vocação à vida religiosa consagrada é a alegria. A alegria deve ser sempre uma marca do consagrado, essa alegria que emana da confiança que somos muitos amados por Deus. O Senhor passa por nossas vidas, seu olhar de amor chama-nos a atenção, sua Palavra provoca-nos e seus gestos de compaixão nos impulsionam a segui-lo, a deixar nossos barcos e redes e, com confiança, anunciar o Reino de Deus. Em um mundo tão carente de esperança, de amor e de vida, a consagração à vida religiosa chama-nos continuamente a levar com alegria e empenho a Boa-Nova do Evangelho. Amados por Deus, fortalecidos pela Palavra do seu Filho Jesus e animados pelo seu Espírito Santo, sejamos, no mundo, homens e mulheres da alegria, da esperança e do amor.”
Frei Jussié José da Silva, 37 anos
Ordem dos Frades Menores Capuchinhos. Pároco da Paróquia Santo Antônio, em Hidrolândia-GO, 17 anos de vida religiosa consagrada.

“Senhor, tu me olhaste nos olhos, a sorrir, pronunciaste meu nome”. Essa frase de uma conhecida canção, me faz retornar há 31 anos, quando fui tocada fortemente pelo amor de Deus, que me olhou, me chamou e me escolheu, tirando-me da segurança da minha vida, plantando em meu coração uma inquietude que me fez buscar respostas para as perguntas que brotavam dentro de mim: qual o sentido da minha vida? Por que sinto que falta algo em minha vida? Essa inquietação me fez buscar a Deus com mais anseio e ele se deixa encontrar por aqueles que o procuram com sinceridade. Em outubro de 1989 eu entrei no convento e o vazio do meu coração foi substituído por alegria e gratidão, de tal forma que parecia transbordar do meu ser. Procurar viver o carisma de ser misericórdia, numa fraternidade de irmãs, tem os seus desafios, lutas, como qualquer estado de vida. Vamos conhecendo nossas próprias fragilidades e as dos outros. Assim, fui entendendo que as dores, os sofrimentos, as labutas diárias são possibilidades para aprender a ser irmã misericordiosa, numa humilde e sincera doação do que faço e, especialmente, do que eu sou. A alegria de ser consagrada ao Senhor permanece no meu coração, como uma chama que me ajuda a recordar o sim que eu quero dar ao Senhor, todos os dias da minha vida.”
Irmã Clécia Maria da Silva, 52 anos
Instituto das Irmãs Franciscanas da Divina Misericórdia (Varjão-GO), 31 anos de vida religiosa consagrada.

É importante compreender nossa vida na Igreja como uma vocação para viver como Jesus viveu, realizando no mundo sua missão de salvação. A vida fraterna é a fundamental missão do cristão que assume a vida religiosa consagrada. Por isso, os religiosos devem recordar a palavra de Jesus “vós sois todos irmãos” (Mt 23,8), por meio de uma vida de consagração, fraternidade e missão. Em outras palavras, se é religioso para rezar, amar e servir, especialmente aqueles que mais precisam: os pobres. Sabe-se que é uma missão exigente, pois o amor de Jesus deve ser a medida do nosso amar e servir. Contudo, é uma responsabilidade suave, porque viver de amor é muito gratificante. À medida que somos fraternos, somos capazes de dar um sentido profundo para a nossa vida. E, assim, até os desafios e dificuldades são superados na graça misericordiosa de Deus. Ser Religioso Irmão é uma grande alegria, porque ser fraterno é o essencial da missão de Redentor. Ao se encarnar, ele se fez nosso irmão da humanidade. Viver a fraternidade de Jesus como ideal evangélico de consagração é a missão da vida religiosa consagrada. O anúncio do Evangelho torna-se mais eloquente quando nossas palavras são acompanhadas pelo nosso testemunho de serviço por amor.
Ir. Marcos Vinícius Ramos de Carvalho, 39 anos
Congregação do Santíssimo Redentor. 16 anos de vida religiosa consagrada. Comunidade São Clemente-Vila Monticelli (Goiânia). Arquivista provincial e professor de filosofia no Instituto de Filosofia e Teologia de Goiás.
Fúlvio Costa