Já se passaram quase sete meses desde que o papa Francisco proclamou o Ano de São José. Com esse tempo de graça, o Santo Padre nos dá a oportunidade de conhecer mais a figura desse homem que tanto tem a nos ensinar. Mas como temos vivido o Ano Josefino? Para muitos, viver um ano santo proclamado pela Igreja só é concretizado a partir da criação de várias iniciativas que movimentem os paroquianos. Mas viver bem esse tempo é ir além das muitas atividades que podemos desenvolver. “O que precisa ser feito é olhar para dentro da vida da Igreja, da família, das pastorais, dos movimentos, das comunidades e perguntar se se trata de criar alguma coisa nova ou de dinamizar melhor o que já temos”, disse em entrevista o padre Antônio Donizeth do Nascimento, administrador paroquial da Paróquia São José, em Goiânia.
Na prática, conforme o entrevistado, precisamos promover uma revisão naquilo que já temos, estruturando organização pastoral genuinamente missionária e o Ano de São José, neste tempo de pandemia, pode ajudar muito nisso, considerando que a família é o ambiente do pai de Jesus. “É uma providência divina que este Ano Santo aconteça durante este tempo de pandemia. José é por excelência o homem esposo, o homem pai, o homem carpinteiro. Ele é o modelo que nos ajuda a descobrir o extraordinário no cotidiano da família: nas coisas chatas, aborrecidas, difíceis, delicadas”. José, na sua época, foi o trabalhador home office dos nossos dias, lembrou padre Antônio, e esse aspecto é extremamente importante para entendermos como viver a mística da relação com Deus no ambiente familiar. “Pensar São José na realidade da vida, com o problema da pandemia, do trabalhar home office e ter que produzir escutando o barulho de criança correndo para lá e para cá, trouxe para os ‘Josés’ das nossas famílias, a compreensão de que ele vivia assim na oficina, cuidando de um menino na carpintaria de Nazaré. Seguramente, a carpintaria era um cômodo da sua casa em Nazaré. Diante disso é importante dizer que São José é o modelo inesgotável para se pensar o ser pai, esposo, trabalhador, operário no ambiente da família em tempo de pandemia, para descobrir a dimensão eclesial que é viver lá na oficina, dentro de casa”, explicou.

Padre Antônio também lembrou a atualidade do tema e de quão importante é recuperar a masculinidade de São José. “É atual demais pensar São José como patrono da Igreja universal, de modo especial, em tempos de pandemia e de escândalos que fragilizam e abalam a fé. José, repito, deve ser para nós modelo de paternidade, de trabalhador, de esposo”, pontuou. Essa figura, inclusive, recupera a masculinidade em crise na atualidade. “Os modelos são dramáticos no mundo da política, da economia, da cultura e também na Igreja. É uma tragédia que tenhamos desenvolvido e aceitado que a influência mundana, mundanista e hedonista decidisse tanto sobre a nossa característica de ser homem e de ser padre. Então, voltar o nosso olhar para o homem José, ensina-nos a cuidar da família e da Igreja com essa virilidade desafetada, despojada, simples, dócil, e ao mesmo tempo, decidida”. Recuperar a figura de José e de Maria, conforme o padre, é resgatar duas figuras da família de Nazaré para o modelo em crise de identidade do homem e da mulher.
Vida Comum

Viver a vida de forma comum, assim como o fez José, é também um aspecto importante a ser considerado neste ano santo. Padre Antônio comentou que o pai de Jesus foi um homem comum na vida comum de família. O trabalho, a fé, as peregrinações a Jerusalém, sobretudo a vida religiosa, foram aspectos importantíssimos em São José, mas é preciso discernir que vida religiosa foi vivida por ele. “José viveu uma religiosidade que não tinha, em nada, invencionices supersticiosas. Precisamos nos desapegar de tantas práticas carregadas de elementos perigosos que não correspondem à verdade da tradição daquilo que a Bíblia revela sobre São José. Muitas práticas da piedade popular precisam ser purificadas. Padre Antônio aponta como podemos viver o Ano de São José a partir da verdade da fé. “Podemos viver bem esse ano santo por meio da escuta da palavra de Deus, da vivência dos divinos sacramentos, na ordem cotidiana da nossa fé, no ritmo do tempo do trabalho e do tempo de Deus, guardando o Dia do Senhor como dia, por excelência, de convivência na família, como dia de gratuidade, pois não há nada mais importante neste Ano de São José do que recolocar em nossa vida o domingo – Dia do Senhor – como o dia da convivência por excelência na família”.
Confiança em Deus
Outro modelo a ser copiado de São José é sua total confiança em Deus. Ele recebe na Bíblia o título de homem justo e isso diz muito sobre o santo. O que significa? “José é chamado de justo no contexto do discernimento do que fazer com um problema grave”, explicou padre Antônio. O entrevistado se referiu à missão dada por Deus a esse simples carpinteiro. A mulher que fora prometida em casamento aparece grávida. José, portanto, tem um problema gravíssimo a resolver. Uma acusação sua levaria Maria ao apedrejamento. Ele poderia ter apelado para a violência ou ter fugido da situação, conforme enfatizou padre Antônio, mas José enfrenta o problema escutando a Deus. “Ele é homem justo porque não fugiu do problema, mas ouve a Deus e deposita sua confiança nele. Assume o filho e a esposa e, em vez de fugir do problema, foge com a família após ouvir o anjo. Essa característica é belíssima”.
José também é o homem que dorme. Sim, mesmo diante de tantos problemas a serem resolvidos, ele dorme e nos faz lembrar da palavra de Deus, evangelho que ouvimos no domingo, dia 13 de junho. “O Reino de Deus é como quando alguém espalha a semente na terra. Ele vai dormir e acorda, noite e dia, e a semente vai germinando e crescendo, mas ele não sabe como isso acontece” (cf. Mc 4,26-27). “José é o homem justo também porque ele dorme. Trabalha, mas também repousa, ele tem consciência de que o homem faz sua parte e Deus faz a dele sempre. O sono de José é essa imagem bonita que tem se disseminado pelo mundo afora, do homem da confiança que sabe que não dá conta de tudo. Nós homens precisamos aprender numa sociedade de homens estressados, deprimidos, que tem que tomar remédio para ter força, para trabalhar, para dar conta de dormir e São José, com gravíssimas questões a serem resolvidas, dorme. Essa é uma dimensão muito bonita e muito mística”.
Fúlvio Costa